terça-feira, 16 de novembro de 2010

Apocalípticos e integrados - Umberto Eco

Em “Apocalípticos e Integrados”, o autor do livro Umberto Eco propunha, em seu prefácio, a divisão nas categorias que davam título à obra relativamente às reações face à cultura de massa e a indústria cultural. De um lado, os que consideravam que a massificação da produção e consumo constituíam a perda da essência da criação artística, da aura e, do outro, os que acreditavam estar-se perante enormes avanços civilizacionais, de uma efetiva e criadora democratização da cultura.
Apocalípticos e integrados são dois termos de definição "genérica" e "polêmica", como bem definiu o autor. As duas palavras "fetiches", nomeadas pelo autor, servem para designar as correntes teóricas: os Críticos de Frankfurt e os funcionalistas. Fetiches porque, segundo Eco, "bloqueiam o discurso", pois em alguns casos incorrem em discussões polêmicas e evasivas. Para ele, os teóricos das duas correntes se diferenciam pela contestação e o questionamento. "O apocalipse é uma obsessão do dissenter, a integração é a realidade concreta dos que não dissentem".
O apocalíptico, seguindo o pensamento de Eco, sobrevive de confeccionar teorias sobre a decadência da sociedade em função da indústria cultural e da cultura de massa. No entanto, esses mesmos teóricos críticos utilizam para difundir suas idéias os próprios canais e meios alienadores da sociedade.
"No fundo, o apocalíptico consola o leitor porque lhe permite entrever, sob o derrocar da catástrofe, a existência de uma comunidade de 'super-homens', capazes de se elevarem, nem que seja apenas através da recusa, acima da banalidade média", acrescenta Eco.
Contudo, Eco considera muito importante a crítica dos teóricos de Frankfurt aos funcionalistas, sobre o aspecto de que estes só vêem a cultura de massa e a indústria cultural de forma positiva, para assim se "embebedarem" no lucro da produção contínua da sociedade.
Os integrados, em analogia metafórica aos funcionalistas, "raramente teorizam e assim, mais facilmente, operam, produzem, emitem as suas mensagens cotidianamente a todos os níveis", diz Eco. Ou seja, de acordo com as concepções teóricas de Eco podemos deduzir que os funcionalistas não estão preocupados com a crítica das ações, mas sim com a praticidade e a funcionalidade do sistema social.
Na verdade, a grande preocupação do funcionalista é que a engrenagem social movida por cada indivíduo e as instituições sociais esteja produzindo constantemente sem erros e falhas. Porém, existe aí uma dose exacerbada de positivismo dos funcionalistas, pois mesmo criticando a própria crítica dos Críticos de Frankfurt, Eco vê a pertinência da contestação dos estudiosos alemães no aspecto de que os funcionalistas pretendem emergir a sociedade na alienação para a condução manipulada de suas funções.
Segundo escreveu Eco, "para o integrado, não existe o problema de essa cultura (popular) sair de baixo ou vir confeccionada de cima para consumidores indefesos", pois a sua pretensão é conduzir a sociedade para à massificação e conseqüentemente tirar proveito com o lucro dessa alienação.
Quarenta anos decorridos, o texto de Eco regressa à memória em face de duas notícias de ontem: por um lado, a quebra brutal das vendas de CD e DVD musicais em benefício dos downloads da internet, por outro, uma crescente diminuição da leitura de jornais nas camadas mais jovens, igualmente em benefício do recurso à rede.
A primeira coisa a sublinhar é que nenhuma das situações parece refletir uma diminuição de interesse pelos conteúdos, seja a música, seja a informação. No tocante à primeira é mesmo de admitir que esta mudança determine um aumento de consumo, sendo previsível que idêntico percurso seja seguido na segunda. Contudo, é inquestionável que a diferença de suportes determina inevitavelmente diferenças no que é transmitido e consumido.
O download tende a determinar um efetivo empobrecimento do fenômeno musical, reduzido a si próprio, quase sempre sem qualquer informação complementar associada. Nomeadamente no caso do CD, a capa e as informações nela contidas têm um evidente papel na fruição musical e, sobretudo, na criação de uma real cultura e gosto de audição.
A generalização do consumo musical nas sociedades contemporâneas é indissociável da aquisição de elementos informativos sobre a música, os seus criadores e executantes, o enquadramento histórico, estilístico e estético das obras fornecido, em maior ou menor grau, pelos textos e imagens da literatura que acompanha a edição discográfica.

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